Pussy Riot: Tornar a Política Divertida Depende de Você

jul 22, 2015 | Artigos e Publicações, Ativismo, Manifestações, Notícias, Opinião PIRATA | 0 Comentários

por Nadya Tolokonnikova

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Pussy Riot na Parada Gay de Toronto. Foto via Toronto Pride.


Imagine se o mundo reagisse à agressão de Putin a Ucrânia como reagiu à agressão dos EUA ao Vietnã. Se artistas, cineastas e ativistas europeus e norte-americanos se juntassem aos manifestantes antiguerra russos e ucranianos para condenar a agressão de Putin, a cultura poderia ganhar essa parada. Em exibição hoje, teríamos versões modernas de Apocalypse Now e Nascido Para Matar, e ao lado de Book of Mormon na Broadway, algo como Hair estaria em cena, mas sobre um soldado russo mandado secretamente para morrer no leste da Ucrânia (e algum tipo de hooligan russo, como o Pussy Riot, o raptaria de sua unidade militar). Imagine.

Os Kubricks e Coppolas do mundo começam a trabalhar quando um tópico se torna inevitável. Esses assuntos inevitáveis ganham vida através de ativistas, estudantes, trabalhadores e professores, que em algum ponto levam a guerra para o lado pessoal. O assunto então se torna importante, e depois é tornado lendário através da arte. É só aí que os cidadãos realmente têm suas vozes ouvidas – não apenas no jornal ou em gritos de protesto – e o poder para forçar o governo a acabar com a guerra.

Só então eu terei orgulho de dizer “Temos o poder”.

No momento, pronuncio essas palavras envergonhada, insegura. Que tipo poder nós temos quando não só estudantes dizem para mim que “não se interessam por política porque isso é chato”? Quem, se não você, poderia tornar isso divertido? Não podemos esperar que Jeb Bush dê uma festa com drag queens durante um protesto. Então se envolva na política e organize uma campanha, assim você pode dar uma festa da vitória com drag queens e DJs feministas. A política, afinal de contas, não é feita só de Bushes e Clintons, mas também de Harvey Milks e Hunter S. Thompsons.

Uma noite num bar, tentei convencer Quentin Tarantino a fazer um filme sobre a futura revolução russa. Uma onde Putin é derrubado e o conflito na Ucrânia termina. Depois de Bastardos Inglórios e Django Livre, não tenho dúvidas que Tarantino faria um filme incrível sobre derrubar Putin. E se todos nós estivéssemos tão envolvidos em política como durante o movimento antiguerra dos anos 60 e 70, Tarantino com certeza faria um filme foda sobre super-heroínas que fazem um túnel sob o Kremlin e trocam Putin pela múmia de Lenin (no final, Putin fica preso no mausoléu da múmia), capturam a torre da televisão e param a guerra na Ucrânia.

E mesmo que não haja um Putin nos EUA, o país também tem seus problemas. A Fox News é o canal de notícias mais popular. Há a morte de Eric Garner e incontáveis vítimas da brutalidade policial. Nos EUA, o aborto ainda é um problema – na mente dos russos, o direito ao aborto é inegável, não um assunto para discussão. Se Deus um dia me tirar da Rússia e dizer que, de agora em diante, tenho que fazer arte política nos EUA, eu acharia mil tópicos para minha arte. Aprenda a amar a política e a política vai te amar de volta. Crie o caos com ações de arte política. Ajude o Pussy Riot em nossa missão antiguerra.

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Pussy Riot na Parada Gay de Toronto. Foto via Toronto Pride.

No dia 26 de junho, o Pussy Riot invadiu o Festival de Glastonbury na Inglaterra, entrando em cena com um tanque. Alguns minutos depois da performance da banda começar, um militar mascarado, de uniforme preto e segurando uma AK-47 saiu de um alçapão: “Estamos fundando a República Popular de Glastonbury! Chega de Pussy Riot e suas ideias liberais! Chega de parada gay no território da nossa república!”, ele disse. A plateia começou a vaiar. Aí duas das garotas do Pussy Riot amarraram o militar, colocaram uma balaclava de arco-íris na cabeça dele, tiraram sua arma e fecharam sua boca com fita adesiva. Aí elas proclamaram os “Dez Mandamentos do Pussy Riot”, incluindo “Não leia as notícias, seja as notícias”, “De uma pausa, faça uma revolta”, “Seja queer” e “Pense diferente, pense feminista”.

“Admiro a Eva”, gritou uma mulher usando uma máscara rosa em cima do tanque. “Enquanto Adão – um sujeito não muito esperto – ficou parado lá no Paraíso, obedecendo todas as ordens divinas, Eva foi lá e achou uma maçã. De acordo com a Bíblia, essa era a maçã do conhecimento. Então temos que agradecer a Eva pela ciência, ônibus espaciais, iPhones, estúdios de gravação, máquinas de café e a internet. Eles dizem que os homens inventaram tudo, mas sem Eva o homem não teria nem começado a pensar e adquirir conhecimento sobre o mundo. É melhor dar uma mordida no fruto da porra da Árvore do Conhecimento, do bem e do mal, do que sentar como um idiota alegre no ombro de Deus. Eva foi a primeira feminista e uma mina muito legal”.

Charlotte Church fala com Maria Alyokhina e Nadezhda Tolokonnikova no Festival de Glastonbury, Inglaterra, em 26 de junho de 2015. Foto por Danny Martindale/WireImage.

A garota de máscara rosa era eu, e fiquei no tanque porque acredito que nós – você e eu – temos que enfrentar nossos governos. Temos que ocupar equipamentos militares. Tenho certeza que poderíamos usar essas coisas de um modo muito mais interessante que nossos governos – poderíamos usar isso como arte, por exemplo, ou como um palco para festivais de música.

O movimento antiguerra ficou no passado e a verdadeira tragédia é que a guerra não acabou com ele. Nossa geração assistiu filmes e cresceu com a noção de que os direitos já estão ganhos, que eles nos são dados por padrão. Os conservadores vão continuar ganhando poder facilmente. Por isso David Cameron venceu as eleições na Inglaterra e cortou benefícios sociais. É por isso que a direita ganha cada vez mais popularidade na França. É por isso que, na Hungria, Vikton Orban está no poder, apoiado por Putin.

Se você acha que sua liberdade e direitos estão garantidos, eles vão escorrer pelos seus dedos. Expanda seus direitos. Conquiste novos direitos. Às vezes, como Alice no País das Maravilhas, temos que correr com todas as nossas forças apenas para ficar no mesmo lugar. Mas a liberdade vale tudo isso.

Maria Vladimirovna Alyokhina e Nadezhda Andreyevba Tolokonnikova do Pussy Riot se apresentam na Worthy Farm do Festival de Galstonbury, Inglaterra, em 26 de junho de 2015. Foto por Danny Martindale/WireImage.

No dia 28 de junho, o Pussy Riot participou da Parada Gay de Toronto, rodando pela cidade num enorme foguete vermelho (ou pênis). O míssil era um Topol-M, os mesmos que fluem às centenas nas ruas de Moscou durante as paradas militares, e simbolizam centenas de políticos babacas como Putin, que só querem a destruição e a guerra. No mundo da política dominado por homens, eles tendem a medir seu pênis pela extensão de seu poder. “Olhe, meu pinto é enorme!”, Putin grita para o mundo com as guerras que começa. O Pussy Riot prefere usar o pênis para o amor, por isso roubamos um dos foguetes de Putin e o trouxemos para a Parada Gay. Agora, esse é nosso Foguete Queer Pussy Riot. Sou mulher, mas tenho um pau maior que o de Putin. Toda mulher tem um pau.

Putin diz ao mundo que a Rússia é um país conservador e atrasado que não está pronto para dar direitos aos gays, que esse é um lugar onde as crianças precisam ser protegidas dos gays. Bom, vou te dizer uma coisa Sr. Putin, isso é mentira. A Rússia é um dos países mais progressistas da Terra – as mulheres russas ganharam direitos, como o sufrágio, antes de suas colegas dos EUA. A Rússia é o berço da vanguarda, não o pântano conservador que Putin quer mostrar. Os direitos LGBTQ são meus valores de família, não seus valores “tradicionais”, que são opressão e violência.

Não precisamos de guerras, não precisamos de papéis de gênero, não precisamos de controle. A Rússia quer ver mais atos de desobediência, como o do magnífico Yes Men. Não quero me gabar, mas depois das nossas apresentações públicas, as pessoas nos dizem que ficaram inspiradas pela arte e ativismo do Pussy Riot. Lembre, também queremos ser inspiradas, como fomos um dia pelas loucas e selvagens riot grrrlz.

Quero ser inspirada por você!

Tradução do russo por Brendan Mulvihill e tradução do inglês por Marina Schnoor.

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