Como alguém que ama cultura pode defender o Monopólio do Copyright?

out 10, 2013 | Artigos e Publicações, Cultura Digital | 0 Comentários

por Rick Falkvinge*, via TorrentFreak

 

Ativistas pela reforma ou abolição do pernicioso monopólio sobre o direito de cópia – copyright – são às vezes taxados como se “odiassem a cultura”. Isso é tão desconcertante quanto errado, visto o quão ameaçador é esse monopólio para os artistas e a cultura. Nós amamos a cultura e é exatamente por isso que criticamos o monopólio.

Uma das acusações mais desconcertantes lançadas contra mim e outros críticos do copyright é que “odiamos a cultura”. Isso não é só estranho à la Igreja Batista de Westboro** (“se você não seguir o nosso dogma, você odeia nosso estilo de vida, independência, liberdade e os gatinhos fofinhos também”), como também é completamente alheio à realidade.

É precisamente por amar a cultura, o conhecimento, a liberdade de expressão que eu critico incansavelmente o monopólio da indústria cultural. De longe, ela é a maior inibidora de criatividade na sociedade atual, conforme basicamente todas as pesquisas realizadas que não tenham sido financiadas pela própria indústria do copyright.

Foquemos em duas áreas aqui: disponibilidade de cultura e compensação aos artistas.

Na primeira área podemos observar que hoje há mais cultura disponível do que nunca houve, e não por causa do monopólio de copyright, mas apesar dele. As pessoas criam como nunca antes, apesar de, muitas vezes, isso ser ilegal. Felizmente, a maioria das pessoas-potencialmente-artistas tem um profundo e saudável desrespeito por essa estrutura monopolista que os impediria de produzir e reproduzir cultura: a cada minuto, 100 horas de vídeo sobem para o Youtube. São 6 mil vezes mais conteúdo do que uma transmissão única em tempo real. Isso significa que pessoas-artistas estão criando hoje programação para 6 mil canais mundiais de TV que funcionam 24 horas, 7 dias por semana, apenas num website de vídeo. A maioria desse trabalho é ilegal por conta da monopolização dos direitos de cópia.

Mas fica pior. Quando você vê a cultura disponível nesse velho sistema baseado em monopólio de copyright, descobre que há um enorme buraco negro em nossa herança cultural onde não é de interesse publicar o que foi cultura há algumas décadas. Somente quando esse monopólio expira é que essa cultura fica novamente disponível através de novas publicações. Há um buraco negro do monopólio do copyright que retira de circulação 90% da nossa cultura, desde o início do século XX. Isso foi ilustrado da forma mais clara o possível por Paul J. Heald, que realizou uma pesquisa no catálogo da Amazon Books e descobriu que livros de 20 anos atrás não estavam mais disponíveis em sua maioria, ao menos não até o monopólio sobre direitos autorais expirar – 90% da nossa cultura desaparece por conta do monopólio do copyright:

 

O sistema atual baseado neste monopólio cria um buraco negro que garante que 90% da produção cultural moderna morra e que nunca se torne disponível novamente durante uma vida humana inteira. Como pode alguém que ama a cultura defender isso? É um sistema que alguém que despreza toda forma de cultura criaria: primeiro faz da criação algo ilegal e depois assegura que 90% da cultura morra e fique indisponível dentro de poucos anos.

A segunda objeção à redução ou abolição do monopólio do copyright tende a ser “como os artistas serão pagos?”. Isso beira à obscenidade quando vem de alguém que defende a ordem atual baseada no monopólio sobre o direito de cópia, na qual 99% dos artistas não conseguem assinar com uma grande editora ou gravadora, e dentre aqueles que conseguem, menos de 0,05% verão alguma vez royalties (esses números são das gravadoras, mas com base na experiência, é seguro afirmar que os números são similares no mercado editorial).

O sistema de atual assegura que 99,995% de artistas batalhadores nunca recebam um centavo. Como alguém que ama a cultura pode defender esse sistema?

O que o sistema de hoje faz, no entanto, é enriquecer atravessadores, parasitas intermediários inerentes ao sistema – que fraudulentamente alegam “falar pelos artistas”, mas que na realidade, os roubam à luz do dia (histórias de editores e produtores medíocres e parasitas roubando descaradamente o resto de dinheiro daqueles últimos 0,005% de artistas que recebem royalties acontecem todos os dias).

Em suma, o monopólio do copyright proíbe artistas em potencial de produzir de cultura, impedem a arte e a cultura de alcançar o público, isola os artistas de seus fãs, impede artistas de receber dinheiro por sua arte e assegura que 90% da cultura moderna tenha uma morte prematura. Essa construção pode apenas ser defendida por gente que diz amar a cultura se estiverem afetadas por uma negação de pensamento racional em um nível religioso.

É hora de pegar o touro pelo chifre e combater os monopolistas nesta questão fundamental: se eles de fato tem qualquer apreço pela cultura. Esse monopólio mata a cultura e talentos artísticos, e isto é fato conhecido e comprovado por dados concretos.

——

* Rick Falkvinge é fundador do primeiro Partido Pirata, o da Suécia. Seu blog é o falkvinge.net, sobre políticas de informação.
**  Igreja conhecida pelo seu ultraconservadorismo: http://pt.wikipedia.org/wiki/Igreja_Batista_de_Westboro

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