#TerrorismoDeEstado

jul 23, 2016 | Artigos e Publicações, Legislação | 1 Comentário

por PIRATAS – RJ

Primeiro, no dia 17 de julho, o físico Adlène Hicheur, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foi deportado para seu país de origem, a França. Em 2009, ele foi detido e condenado a cumprir pena na França por suposta associação com grupos extremistas e, depois da pena cumprida, veio ao Brasil lecionar na UFRJ. Não houve qualquer explicação sobre a deportação dele. Simples e sumariamente, da noite para o dia, foi expulso do país. Segundo a própria UFRJ ele realizava trabalhos de pesquisa na área de física de partículas e nunca gerou qualquer problema. Agora, dia 21 de julho, 12 mandados de prisão e 19 mandados de busca e apreensão, expedidos para 10 estados brasileiros, foram revelados. É a operação batizada pela Polícia Federal como HASHTAG. Do total de 12 mandados de prisão, 10 foram cumpridos. Tudo corre no mais absoluto segredo, inclusive o próprio cumprimento da operação não deveria ter vindo a público. É uma operação secreta contra uma célula terrorista?

Bom, segundo o ministro da defesa, o ministro da justiça e o próprio juiz responsável pelo caso, não se trata de um grupo com potencial de efetivar qualquer atentado. Segundo todos eles, esse é um grupo amador e desarticulado, que apenas fez alegações do que eles chamaram de “preparo” via Internet. Fizeram, também segundo as autoridades, exaltação a atos terroristas cometidos no exterior. As autoridades admitem que nenhuma das pessoas detidas saiu do país para ter contato com qualquer grupo terrorista. O alegado “preparo” teria a ver com contatos com site de venda de arma e uma menção à realização de aulas de artes marciais, e apenas isso. Ou seja, não há, ou pelo menos não foi apresentado ao público, qualquer tipo de materialidade de crime concreto. Existem subjetividades apenas. Não fosse tamanha inconsistência de materialidade de crime, ficam questões de como se obtiveram tais alegações apresentadas pelas autoridades.

Elas dizem ter colhido provas em redes sociais e aplicativos de mensagem, como o Whatsapp. Mas não foi esse mesmo Whatsapp que foi bloqueado em todo o território nacional no último dia 19 por não ser possível coletar dados já que suas mensagens são criptografadas? O próprio ministro da justiça alegou estar estudando a criação de projeto de lei para obrigar quebra de criptografia nesses casos. Oras, isso já foi feito então? Ou é algum backdoor fornecido pelo próprio Whatsapp? Ou existe a capacidade do Estado inserir, remotamente, um vírus capaz de coletar dados no aparelho celular de qualquer cidadão? Ou mais, seria simplesmente coleta de dados em redes sociais públicas e chats públicos?

Outro questionamento é sobre para onde esses presos foram levados. A justiça federal não diz. A polícia federal não diz. Ninguém diz*. O que o ministro da defesa Raul Jungmann disse é que essa operação seria mantida completamente em sigilo, não fosse a esposa de ums preso que compartilhou a história no Facebook. Ou seja, além de não haver qualquer informação sobre o paradeiro das pessoas presas, não deveria sequer ter havido a publicização das prisões efetuadas. Isso é sequestro? Essas pessoas estão tendo acesso a alguma defesa? As famílias tem informações sobre o que está acontecendo? Os direitos constitucionais e civis estão sendo garantidos? Não existe qualquer garantia pública sobre essas questões. Ao que parece, essas pessoas estão sendo submetidas ao arbítrio do Estado e à Exceção dos direitos.

Os 10 presos foram enquadrados na lei sobre terrorismo, sancionada pela presidente afastada Dilma Rousseff, e duramente criticada por todos os movimentos sociais. A lei cria brechas para criminalização de movimentos políticos e sociais e permite prisões como essas, sem qualquer materialidade de crime. No apagar das luzes do seu governo, Dilma sancionou essa lei, ignorando todos os indicativos que isso abriria as portas para processos de perseguição sumária e supressão de direitos básicos. Falta de aviso não foi, e está aí a primeira leva das vítimas da lei de terror do Estado.

É curioso notar que as justificativas dadas pelo poder público para tais prisões abundam em toda Internet. Notadamente em páginas do Facebook de tom de extrema direita onde aspectos de perseguição religiosa contra religiões de matriz africanas, homossexuais e minorias são publicados sem qualquer constrangimento. Também não são poucas as páginas de exaltação a execuções praticadas por agentes de força policial, inclusive com vídeos das ações de execução praticadas por esses agentes do Estado. Hoje o Brasil é denunciado internacionalmente pelo número alarmante de execuções causadas por agentes que são financiados pelo Estado e, tal qual alegam ser o caso dos presos, praticam artes marciais e tem treinamento com armas pago pelo contribuinte. O armamento, comprado legalmente e usado nessas execuções, também é fruto do dinheiro de quem paga seus impostos.

É verdade que vivemos em estado de terror. Mas esse estado é produzido e estimulado pelo próprio Estado Brasileiro com a eterna produção da desigualdade, força motriz de toda sorte de violência. É de extrema importância que grupos extremistas com potencial de violência sejam monitorados, mas não pode haver qualquer forma de seletividade nessa ação. Parlamentares que exaltam torturadores reconhecidos, grupos religiosos extremistas infiltrados em casas legislativas, facções supremacistas em diversas cidades, movimentos de supremacia branca separatistas, todos esses devem ser monitorados e não apenas adeptos de determinada fé, como o islã. No fim, perdura o terror de Estado, onde o medo gera o controle de uma população cada vez mais desorientada e desesperada por socorro. Em tempos de eleições, quem melhor vender o remédio pra essa nova doença, ganha.

Em tempo: a embaixada norte-americana disse que não mudou as recomendações aos seus cidadãos que estão vindo ao Brasil, e a recomendação é exclusivamente para tomar cuidado com mosquitos que podem transmitir Zika. Afinal, nosso cotidiano que é terrorismo.

* Após a finalização do presente texto, finalmente foi divulgada publicamente (mais de 24 horas depois das prisões) a informação sobre o local para onde foram levadas as vítimas da lei de terror: de acordo com a Polícia Federal, eles se encontram no presídio federal de Campo Grande (MS). Esse presídio recebe detentos considerados de “alta periculosidade”, como chefões do tráfico. Fonte: http://naofode.xyz/8cgp

 

FONTES: 

1 Comentário

  1. Anders Bateva

    Não faz sentido pedir que não haja seletividade na escolha dos monitorados, pois “quem vigia o vigia?” Sempre vai haver parcialidade, pois o poder é de alguns e não de todos. Os alguns no poder não vão decidir contra si ou seus aliados…

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