Sobre mulheres e política

jul 28, 2015 | Artigos e Publicações, Notícias, Opinião PIRATA | 0 Comentários

por Fabiane K. Bogdanovicz

Este texto foi psicografado no ritmo frenético dos pensamentos, deslizando na cadeia dos significados, navegando o rio das associações livres num barco pirata a fim de encontrar o mar caótico do (in)consciente coletivo…

Sobre mulheres e a / na política

11781863_10153536417807028_5003110839305394901_nAno de eleição. 30% das vagas partidárias destinadas às mulheres, pois “somos mais de 50% da população” e apenas … de cargos na política. E aí, na propaganda eleitoral, essa mulher enche a boca para falar que é “mãe de família”, argumento usado para demonstrar como é preocupada com a segurança, com as contas do final do mês, com a educação, saúde, e todo tipo de tema genérico cujo domínio o termo “mãe” socialmente lhe garante. Essas mulheres na política vêm para reproduzir um papel social muito específico, um estereótipo de mulher, que é culturalmente aceito – e, assim, não-ameaçador. Como seria a aceitação de uma mulher que fosse ao ar dizendo que é solteira, que não tem filhos nem tem vontade alguma de tê-los? (Se fosse nova, diriam que ela mudaria de idéia com a “maturidade”. Se fosse mais velha, chamar-na-iam de “mal comida”, que ficou “para tia”, e daí para baixo.) Será que para ter espaço na política (nas questões da polis, da cidade), no espaço público (fora do espaço privado, que é o espaço historicamente reservado à mulher), a mulher precisa deixar claro que ela sabe que seu papel principal é o de mãe (obviamente legitimando uma idéia de família nuclear, heterossexual, monogâmica, patriarcal), que é dentro do lar?

A mulher não pode ser vista como um ser independente, autônomo. Um ser com idéias próprias, com desejos próprios, que não passam por uma família, por um parceiro – um macho –, pelos filhos que são socialmente exigidos que ela tenha. Ela não pode, pois assim ela é ameaçadora. Ela é historicamente associada às forças da natureza, às fases da lua, às bruxas, à TPM, à fofoca, ao descontrole emocional, à desrazão, à Eva mordendo a maçã – a ruína do Homem e a queda do Paraíso. E, para ser aceita, ela precisa ser Maria, mãe devotada, cuidadora da família, a grande mulher atrás de um grande homem (não ao lado, nem à frente e menos ainda sozinha). A mulher entra na política partidária para ocupar uma cota obrigatória, para legitimar um discurso sub-reptício de que seu lugar primário é em casa, para reproduzir a concepção de um ser mulher como algo invariavelmente atrelado à maternidade; não para reivindicar mudança, autonomia, liberdade, voz, espaço de fala e de protagonismo, mas para desempenhar o mesmo papel que vem sendo historicamente a ela delegado.
E nos “nossos” espaços, que propomos como diferentes, alternativos a esse modelo político padrão, tradicional, que consideramos precisar ser ultrapassado? Como garantimos que as mulheres não estejam aqui apenas “cumprindo tabela”, decorando o cenário de uma peça teatral muito bonita onde homens falam da importância das mulheres na política, de feminismo, sem garantir o espaço de fala e de protagonismo das companheiras? Como nos comportamos quando uma mulher, a quem é historicamente negado o espaço de fala, expressa sua opinião? Com quanto de paciência e respeito conseguimos lidar com o que consideramos como erro ou despreparo de uma companheira que está dando seus primeiros passos em uma experiência de participação política? Vamos dizer que o partido não é local para que essa mulher comece a falar, se expressar, protagonizar?
Não basta colocar fisicamente uma mulher em um lugar para garantir a participação de quem foi ensinada desde a infância que o certo era se comportar, ficar quietinha, sentar com as pernas bem fechadas, prestar atenção no que os outros estão dizendo sem responder, obedecer, não se mexer muito para não despentear o cabelo, ser prestativa, ficar na cozinha enquanto os homens estão conversando, e que se tiver opiniões demais, não irá ser desejada por ninguém.
É claro, este texto nem sequer tangencia o como é crescer em um corpo que é lido como feminino e por isso passar toda (ou quase toda) a vida introjetando moldes e valores culturais injustos, de insegurança e silenciamento. Mas propõe que reflitamos sobre: como fazer do Partido Pirata um espaço aberto e seguro para o protagonismo feminino, com respeito às companheiras, das mais experientes às mais novatas, para que nosso barco seja plural, diverso, respeitoso, honesto, combativo e colaborativo?

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