Sites de PT e PSDB são ‘hackeados’: Manifestantes ou Terroristas?

out 8, 2015 | Artigos e Publicações, Ativismo, Legislação, Manifestações, Notícias | 0 Comentários

No começo da semana, o site do PT sofreu um deface* por grupo intitulado Anarchy Ghost e teve mensagens contra o governo publicadas em seus domínios. Agora, foi a vez de o site do PSDB de Minas Gerais passar pela mesma situação: na manhã desta quarta-feira, o grupo de nome Brazilian Cyber Army havia trocado a página inicial do site do partido pela imagem abaixo.

Interpretando papéis antagônicos no jogo de cena político, PT e PSDB concordam quanto ao tratamento que esperam ser dado a atos como este. O PSDB-MG repudiou em nota a manifestação em seu site, que entende por “transgressão da ordem legal vigente”. O governo, por sua vez, propôs e a Câmara aprovou dispositivos legais pretensamente anti terroristas (PL 2016/2015 ) que atingem em cheio críticas deste tipo, prevendo penas de até 30 anos de prisão.

Na semana passada, o grupo cyberativista ASOR HackTeam alterou a página do deputado federal Maurício Quintella, chamando a atenção para o o que considera uma proteção extra às estruturas dominantes estabelecidas.

O grupo afirma no texto veiculado no site: “Todos os pontos da lei são extremamente genéricos, inclusive os que tratam da parte de informática. Um deface seria considerado cyberterrorismo? Um ataque de negação (DDos) de serviço? Cabe lembrar que para ambos os casos existe precedente internacional de legalidade enquanto manifestação legítima. E vazamentos de informações de interesse público, terrorismo? A própria parte que fala sobre coagir autoridades, o que seria isso? O legislativo e o executivo funcionam na base da pressão popular, isso passaria a ser terrorismo?”

QUAL A POSIÇÃO DO PARTIDO PIRATA?

Uma das cláusulas pétreas dos piratas — ou seja, artigos do estatuto que norteiam o direcionamento de nossas ações — é a defesa do hackerativismo**.

Apesar de o termo estar envolto em uma espécie de aura midiática, que criou uma associação natural com invasores de sistemas de banco e ladrões de senha de e-mail, hacker é nada mais que o termo que, em inglês, designa uma espécie de “decifrador” — um indivíduo que “desmonta” um sistema (seja este eletrônico ou não) para entender seu funcionamento, cuja finalidade pode ir da simples reprodução (cópia) à implantação de melhorias. O que faz dos brasileiros, naturalmente, hackers por vocação.

O hacker pode ser o sujeito que substitui as peças indicadas pelo fabricante por outras mais baratas (mas que funcionam!) numa comunidade onde os recursos são escassos, ou aquele indivíduo que ensina seus vizinhos a criar uma cisterna com filtro caseira e reduzir sua dependência dos serviços oferecidos (nem sempre) pelo governo. No âmbito das comunicações e sistemas digitais, são pessoas que encontram facilmente as fragilidades dos sistemas, o que acaba contribuindo pela criação de sistemas melhores e mais seguros. Agências de inteligência e bancos, por exemplo, notoriamente contratam hackers que expõem fragilidades em seus sistemas de defesa.

Acreditamos que o conhecimento desses sistemas dá ao cidadão maior possibilidade de escolha, mais liberdade e independência de produtos ou sistemas impostos (caros, quase sempre). Deve ser, portanto, tratado como um direito, inclusive nas redes e internet.

EM DEFESA DO HACKERATIVISMO – Carta de Curitiba

Proclamamos que a neutralidade da rede é necessária para manter uma Internet livre e garantir a igualdade de tratamento entre todos os usuários. O Estado deve garantir o acesso livre e igual em contraposição ao interesses corporativos e políticos. Em nenhuma circunstância pode haver qualquer coerção governamental ou empresarial para filtrar ou manipular os dados transferidos. A igualdade de tratamento dos dados só pode ser garantida se os dados são transmitidos sem monitoramento do conteúdo e desvinculado de informações sobre os  remetentes ou destinatários. Internet neutra significa também assegurar a liberdade de expressão. 

“Sob a mesma inspiração se apresenta nossa defesa do hackerativismo como um conjunto de  práticas que envolvem o trabalho com dados — livremente disponibilizados ou obtidos através de outros meios — que contribuam para transformações políticas ou sociais. O hackeamento de dados, bem como seu compartilhamento, devem ser reconhecidos como ato político legítimo, desde que tal ato venha contribuir para causas de interesse público e não visem prejuízo material ou moral de indivíduos em particular. A liberdade de manifestação e as ações políticas virtuais — DDoS e deface — devem ser asseguradas pelo Estado, que de igual forma deve desenvolver  programas de proteção aos whistleblowers. 

“Ressaltamos o compromisso inegociável com a defesa de whistleblowers, hackers e ativistas que sofrem uma perseguição política injustificável por conta de seus esforços em prol da radicalização da democracia digital em nossas sociedades. Pessoas como Chelsea Manning, Edward Snowden, Aaron Swartz e Anakata são alguns dos principais responsáveis pelo surgimento e pelo amadurecimento de uma consciência pirata, deixando cada vez mais claro que mesmo o ativismo mais descentralizado é perseguido e combatido pelas instituições estatais com a força e o arbítrio das estruturas mais autoritárias, policialescas e opressivas, colocando em jogo todas as conquistas democráticas em nome de uma noção estadocêntrica de segurança, que promove o sacrifício de alguns dos indivíduos mais brilhantes de nossa geração em nome da consolidação de nichos de poder institucional que visam a supressão dos direitos de todos nós. Devemos, portanto, proclamar o imperativo de se buscar desenvolver programas de proteção aos whistleblowers e lutar pelo fim do aprisionamento de prisioneiros de consciência e pela libertação imediata daqueles que já foram encarcerados.  

Ahoy!  

Coletivo PR do Partido Pirata “

*Deface, como é conhecido popularmente, é um termo de origem inglesa para o ato de modificar ou danificar a superfície ou aparência de algum objeto. Na segurança da informação, é usado para categorizar os ataques realizados por defacers e script kiddies para modificar a página de um site na Internet.

O ato pode ser analogamente comparado à pichação de muros e paredes. O autor do deface geralmente é referenciado como defacer ou também pichador.

** Hackerativismo (uma junção de hack e ativismo) é normalmente entendido como escrever código fonte, ou até mesmo manipular bits, para promover ideologia política — promovendo expressão política, liberdade de expressão, direitos humanos ou informação ética.

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