Retaliação cruzada em propriedade intelectual do Brasil na OMC

jan 20, 2013 | Cultura Digital | 1 Comentário

Em 2009, o governo brasileiro ganhou a disputa num painel da Organização Mundial de Comércio (OMC) sobre a legalidade dos subsídios que os Estados Unidos ofereciam aos seus produtores de algodão. Para compensar o prejuízo brasileiro, a OMC autorizou uma retaliação comercial de 869 milhões de dólares, que poderia ser distribuída entre produtos e serviços (somando 561 milhões) e retaliação cruzada em propriedade intelectual (somando os 268 milhões restantes). A retaliação cruzada é um mecanismo que permite que se puna com o não pagamento de royalties de propriedade intelectual prejuízos causados no comércio de produtos e serviços. Trata-se de um mecanismo que busca penalizar em situações assimétricas onde a elevação de tarifas de produtos, muitas vezes essenciais, prejudica mais o país que está impondo as sanções do que aquele que as recebe. Embora autorizado duas vezes pela OMC (favorecendo Antigua e Equador), o mecanismo nunca foi posto em prática, porque embora amparado pelas leis do comércio internacional, os Estados Unidos e os países europeus pressionaram para que ele não fosse aplicado.

Para entender: a retaliação cruzada em propriedade intelectual permite que por exemplo, o governo brasileiro distribua milhares de cópias de qualquer filme exibido nos cinemas ou lançado em DVD no país para todas escolas brasileiras, sem pagar nenhum centavo para a distribuidora e este ato estaria amparado no acordo da OMC e, portanto, os estúdios nada poderiam fazer contra o governo brasileiro. O mesmo poderia ser feito com qualquer tipo de produto protegido por patentes e direitos autorais registrados em território americano.

Quando o Brasil estava prestes a aplicar a retaliação em 2009-2010, os Estados Unidos recuaram e propuseram uma série de medidas compensatórias. No entanto, a recente aprovação da Lei Agrícola americana renovou os subsídios ilegais e colocou o Brasil novamente na condição de implementar a sanção. Com isso, surge para o governo brasileiro uma oportunidade única de aplicar a retaliação cruzada em propriedade intelectual, que pode ser executada de diferentes maneiras. Se conseguir implementar a retaliação cruzada, o Brasil abrirá importante precedente que poderá ser explorado por países menores. Por isso, é preciso que a retaliação seja muito bem pensada e executada.

No entanto, a autorização para essa retaliação é uma espécie de crédito que o Brasil detém no comércio bilateral e, por isso, deve ser exercido de acordo com os princípios e estratégias das políticas públicas. Não faz tanto sentido, retaliar os Estados Unidos e, consequentemente, consumir esse crédito, com a suspensão do pagamento de royalties de produtos da cultura comercial, cuja democratização traz apenas benefício econômico à população. Os primeiros candidatos de interesse público em matéria de propriedade intelectual são os medicamentos. Mas há também outros candidatos nas esferas das políticas relacionadas com ciência, educação e cultura.

Dados os últimos acontecimentos, com a morte do hacker Aaron Swartz, um ítem ficou em em evidência é o de assinaturas de periódicos científicos. O setor é um sério candidato à retaliação cruzada porque reúne simultaneamente relevância econômica e interesse público. Só o consórcio liderado pelo governo federal gasta mais de 60 milhões de dólares anuais com assinaturas de revistas científicas, tendo a gigante norte-americana Thomson Reuters em torno de 40% desse mercado. No que diz respeito a demanda, o mercado é concentrado em dois grandes consórcios de universidades, o que facilitaria a implementação da medida. De certo modo, o governo brasileiro tem a oportunidade de protagonizar a causa pela qual morreu Swartz, dado o impacto certo da adoção dessa medida por um país de tais proporções tanto internamente quanto no âmbito internacional.

Todas essas possíveis medidas têm o mérito de serem simples e facilmente mensuráveis, já que existe um custo de licenciamento estabelecido para esses produtos, bem como atingiriam atores econômicos relevantes, causando incômodo político dentro dos Estados Unidos e obtendo o duplo resultado de punir e forçar o país a cumprir as regras da OMC. Além disso, poderiam ter impacto positivo no desenvolvimento de políticas brasileiras nas áreas da ciência, educação e cultura.

O Partido Pirata do Brasil convida a todos para acompanhar com atenção este tema e para pressionar os Ministérios da Educação e Cultura e Ciência e Tecnologia para que se faça uma discussão aberta sobre a retaliação cruzada por periódicos científicos, visando o interesse público.

Com informações do Blog Pablo Ortellado

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