Copyright: a mentira contada e a prosperidade e crescimento na cópia

jul 4, 2015 | Artigos e Publicações, Compartilhamento de arquivos, Notícias, Opinião PIRATA | 0 Comentários

Aqui temos dois textos de Rickard Falkvinge, fundador do Partido Pirata.

A ideia toda do monopólio do copyright está baseada numa mentira colossal

O monopólio do copyright está baseado na ideia de troca. Em troca por direito exclusivos, a indústria do copyright forneceria ao público cultura e conhecimento. Na verdade a premissa inteira é uma mentira, já que criadores desvinculados seguem se esforçando para fornecer cultura e conhecimento independentemente.

O monopólio do copyright foi restituído na Grã-Bretanha em 1710, depois de prescrever na Inglaterra em 1695. Ele foi promulgado por insistência dos impressores (não dos escritores), que afirmaram que se não detivessem direitos exclusivos, para aumentar os lucros, nada seria impresso.

(Perceba a diferença entre livros sendo escritos, por um lado, e sendo impressos e distribuídos por outro. Foram os impressores, e não os escritores e autores, que motivaram o retorno do monopólio de copyright por meio do chamado Estatuto de Anne).

O parlamento da Grã-Bretanha aceitou essa premissa, e assim se formou o contrato social do monopólio do copyright: “Em troca do único serviço que pode fazer com que a cultura seja produzida para benefício do público, serão garantidos direitos de exclusividade por tempo limitado aos editores e distribuidores”.

Perceba aqui essa presunção importante: se os direitos de exclusividade – o monopólio dos direitos autorais – não existisse, não haveria cultura. É com base nesse contrato que os governos têm agido desde então: em troca de fornecer um serviço mágico que faz a cultura existir em primeiro lugar, os editores têm usufruído de direitos exclusivos que os permitem publicar ou não publicar certo material.

O contrato social entre o público e a indústria de copyright é que, em troca por direitos de exclusividade, os editores disponibilizarão a cultura, sendo os únicos capazes de supri-la.

Mas a premissa toda é bobagem.

Com o advento da internet, o que vemos são pessoas criando apesar dos direitos exclusivos deste monopólio, em vez de por causa deles. Milhões de criadores – milhões! – renunciaram publicamente a seus já concedidos direitos de exclusividade ao publicar sob uma licença Creative Commons.

O YouTube sozinho recebe 300 horas de vídeo novo a cada minuto. Isso significa que o YouTube fornece 18,000 canais de TV ininterruptos, a maior parte dos quais não merecem ser assistidos – em outras palavras, exatamente como os antigos canais de TV.

A noção de que apenas a indústria do copyright é capaz de fornecer cultura foi exposta como uma mentira enorme, audaciosa e totalmente descarada.

Então, se você fosse o governo, o comprador nesse cenário, o que você faria? Você, o comprador que dá direitos de exclusividade muito valiosos para a indústria do copyright, que afirmou que a existência desse contrato era a única forma de fazer com que qualquer cultura fosse produzida – o que você faria agora que fica muito claro que tem pagado um preço alto demais?

Você acabaria com o contrato com esse vendedor mentiroso de cultura pública que exigiu direitos exclusivos prejudiciais em troca pela criação de cultura. Você encontraria outro fornecedor que apresentasse um negócio melhor para o público. E, mais importante ainda, você não se importaria com o que vendedor com que costumava fazer negócio – a indústria do copyright – tivesse a dizer sobre suas novas negociações.

É assim que funciona qualquer licitação, no fim das contas: se você está infeliz com um fornecedor, você procura um novo, e, claro, o velho fornecedor não tem nada a dizer sobre o novo negócio. Não há razão nenhuma para que a cultura e o conhecimento funcionem de forma diferente.

Em outras palavras, não há razão nenhuma para que a indústria do copyright usufrua quaisquer direitos de exclusividade, e, em particular, não há razão alguma para que eles tenham algo a dizer sobre esses direitos serem revogados. Eles não cumpriram sua parte no contrato social, então o contrato foi revogado. Fim da história.

A cópia ilegal sempre criou emprego, crescimento e prosperidade

Ao longo de toda a história, aqueles que copiaram sempre foram os mais prósperos  – e isso devido à cópia. O banimento da cópia, como os monopólios de patentes e copyright, são apenas protecionismo industrial.

Samuel Slater

Muitas vezes olhar a história ajuda a compreender o momento atual, enquanto vemos como a história se repete vez após vez.

No fim dos séc. XVIII, o Reino Unido era o império que estabelecia as leis no mundo todo. Os Estados Unidos ainda eram em grande parte uma colônia – mesmo que não formalmente, era assim que o mundo civilizado, o que então queria dizer França e Reino Unido, se referia a eles.

O Reino Unido tinha uma visão estritamente protecionista do comércio: toda a matéria prima precisava vir para a Inglaterra, e todos os bens de luxo precisavam ser feitos com esses materiais dentro do Reino Unido, para então serem exportados para o resto do mundo. Resumindo a história, o valor tinha que ser criado no Reino Unido.

Foi estabelecida uma legislação para que esse efeito se intensificasse. Levar a capacidade de refinar materiais para outro lugar – o mero conhecimento de fazer isso – era ilegal. “Cópia ilegal”, para ser mais preciso.

Examinemos um criminoso terrível daquela época, Samuel Slater. No Reino Unido ele era até mesmo conhecido como “Slater the Traitor”, Slater, o Traidor. Seu crime foi memorizar os desenhos de um moinho têxtil (um modo de usar a força da água para operar uma tecelagem), se mudar para Nova York, e copiar o moinho têxtil inteiro de memória – algo muito ilegal. Devido a seu ato criminoso, construir o que acabou sendo chamado de “Moinho de Slater”, ele foi louvado como “pai da Revolução Industrial Americana” por aqueles que posteriormente viriam a substituir o Reino Unido em seu papel dominante – isto é, os estadunidenses. Esse criminoso copiador tem uma cidade com seu nome.

Copiar cria emprego e prosperidade. Copiar sempre criou emprego e prosperidade. São aqueles que não querem competir que tentam legislar um direito de repousar sobre suas conquistas e tornar a cópia ilegal. Nunca funciona.

Podemos também olhar o início da indústria do cinema. Essa indústria foi atrasada por monopólios de patentes dos piores monopolizadores da história industrial, Thomas Edison e sua empresa, a Western Electric. Eles essencialmente eliminavam qualquer empresa de cinema que começasse em Nova York. Algumas empresas que estavam começando  – Warner Brothers, Universal Pictures, MGM – portanto escolheram se estabelecer o mais longe possível do monopolista, e seguiram para um subúrbio inexplorado próximo a Los Angeles, na Califórnia, que na época era conhecido como “Hollywoodland” e que tinha uma placa enorme com esse nome. Ali estariam seguros quanto a aplicação das patentes de Edison pela mera distância que interpuseram entre si mesmas e ele.

Sim, você leu certo – a indústria inteira do cinema foi fundada com base na pirataria. Que, mais uma vez, levou a empregos e prosperidade.

O núcleo do problema é esse: aqueles que decidem que é “ilegal” copiar o fazem com base em evitar competição, não com base em algum tipo de elevação moral. É apenas protecionismo industrial. Neo-mercantilismo, se preferir. Copiar sempre cria emprego e prosperidade. Portanto, concordar voluntariamente com os termos das indústrias incipientes, termos esses especificamente escritos para impedir que os outros também atinjam prosperidade, é tanto um negócio ruim quanto uma política ruim.

Eu iria sem problemas até o ponto de dizer que é um imperativo moral desobedecer quaisquer leis quanto à cópia. A história sempre vai o colocar do lado certo, como foi o caso de Samuel Slater, por exemplo.

Para um exemplo mais moderno, temos o Japão. Quando eu me criei, nos anos 1980, a indústria japonesa era conhecida por suas cópias ruins e baratas. Eles copiavam tudo, sem vergonha alguma, e nunca chegavam a atingir qualidade. Mas eles sabiam algo que o ocidente não mais sabia: copiar gera prosperidade. Quando você copia bem o suficiente, você aprende num ritmo impressionante, e uma hora você se torna o líder de inovação e redesign, melhorando aquela inovação passo a passo que você aprendeu a copiar. Hoje o Japão faz as coisas de melhor qualidade em qualquer categoria.

Os Japoneses sabiam e compreendiam que leva três gerações de cópia, e uma enorme disciplina de trabalho, para se tornar o melhor do mundo em qualquer indústria. Recentemente, para minha grande surpresa, eles superaram até mesmo os Escoceses como mestres do Uísque (sou um grande fã do Uísque escocês, e isso me foi uma fonte pessoal de confusão, embora eu entenda como isso funciona no nível racional).

No nível pessoal, quase todo bom programador que eu conheço aprendeu sua arte copiando o código de outros. Copiar causa prosperidade tanto no nível nacional quanto no individual. Aqueles que buscarem tornar a cópia ilegal, ou obedecer a banimentos tão injustos contra a cópia, não têm qualquer base moral – e francamente, acredito que as pessoas que voluntariamente escolham obedecer a leis dessa forma injustas não mereçam prosperidade, e mereçam sim cair junto com seu mestre, quando chegar a hora dele.

Nunca ninguém jamais liderou caminhando voluntariamente atrás de outro. Nós, os restantes, copiamos, compartilhamos e inovamos, e não esperamos que ninguém tente legislar para evitar a competição.

Obs.: os artigos foram originalmente publicados no TorrentFreak, aqui e aqui. A tradução é do Eduardo Pinheiro, colunista do site Papo de Homem e que escreveu o artigo “Cópia de arquivos na internet – um raciocínio em 7 pontos curtos”.

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